quarta-feira, 21 de outubro de 2009

Num pequeno instante


Quando você está caminhando sozinho pela rua em uma tarde qualquer de um dia comum. Pode estar indo ao supermercado ou à lotérica pagar uma conta atrasada, tanto faz. Entre um passo e outro, entre uma olhadinha na vitrine dessa ou daquela loja, vem um estalo. Assim, do nada. Não consegue descrever bem o que é. Apenas começa a rir sozinho.

Nesse momento, nesse pequeno instante em que não liga para o que vão pensar de você, vem a certeza. A certeza de que está feliz, de que é feliz. Não entende o motivo. Até porque a sua conta bancária não possui muitas cifras, o seu cabelo não é o mais sedoso, seus dentes não são os mais brancos e as suas medidas não são as ideais. Mas quer saber? Isso não importa. Não nesse pequeno instante. Está ocupado demais sendo a pessoa mais feliz do mundo.

Fica um pouco eufórico, um pouco assustado e bobo, muito. Tem até vontade de acenar para quem está a sua volta. Anda mais alguns passos, uma quadra no máximo, e começa a recuperar os sentidos. Então, aquele sorriso acriançado, bêbado e cego perde o fôlego e desaparece. Bate um arrependimento. É capaz de jurar de pés juntos que todo mundo viu. “Que vergonha!” Melhor chegar ao mercado de uma vez e se esconder na seção dos enlatados. E entre ervilhas e pêssegos em calda, a vida enferruja.

Compra pão, duas caixas de leite semidesnatado, presunto e queijo. No caixa, afirma com a cabeça que encontrou tudo o que procurava. Antes de chegar em casa, ainda entra em uma farmácia para comprar aquela nova pasta de dente com agentes branqueadores que está na promoção. E não percebe que são as lembranças da sua infância, essas arteiras que, às vezes, conseguem pular os muros da inconsciência para lhe convencer de que a felicidade é feita de pequenos momentos.

Para isso, elas fazem você voltar no tempo. Numa época em que fazia grandes escavações arqueológicas no quintal da casa da sua avó. Numa época em que seu pai pedia para que, juntamente com suas irmãs, fizesse fila indiana para ir até o clube de piscina escorregar no maior tobo-água de dez metros do mundo. Numa época em que era capaz de voar em uma pequena bicicleta vermelha, ao menos por dois segundos.

Um comentário:

  1. Adorei esse texto.
    Fica um pouco eufórico, um pouco assustado e bobo, muito. #fato isso

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