... ninguém vai bater na sua porta e o telefone não vai tocar. Não! Nem adianta espernear. É preciso entender que a amizade não tem hora exata nem dia certo para acontecer. Pedir licença ou agendar visita? Que nada! Ela não é lá muito chegada a essas coisas de etiqueta. A amizade é (pontinhos) inesperada. Pode surgir após a bebedeira em alguma dessas festas em que estudante não paga até a meia noite. Ou então, enquanto você espera para ser atendido em um consultório médico qualquer, após ter lido na Caras de abril do ano passado os segredos da Luiza Brunet para chegar aos quarenta com o corpo em forma.
A amizade é (pontinhos) a panacéia dos pandemônios panacas. Pode vir de moto em uma madrugada fria de inverno para lhe fazer companhia enquanto sua dor de dente não passa. E não reparar no seu mau-humor, nas suas dengosidades ou no seu cabelo desarrumado. A amizade é (pontinhos) deveras escandalosa. Adora rir grande e ruidosamente. Não tem receio algum em arrotar na sua frente ou em mijar de porta aberta. Gosta de falar. Falar alto, falar bem, falar mal, pelos cotovelos, pra dentro, pra fora. Falar. E ouve como ninguém mais.
A amizade é (pontinhos), (pontinhos) e mais (pontinhos). Infinitos deles. È uma reta que só termina no além mais. Ela ama um amor por vezes maior do que o entre irmãos. Porque não vem do mesmo berço, do mesmo ventre. Tem o trabalho de lhe escolher entre os quase seis bilhões e quinhentos milhões de desconhecidos que existem no mundo para expor fragilidades, revelar medos e guardar segredos. A amizade é aquela que diz “você está com uma casquinha de feijão no dente”. É aquela que diz “não fica assim, ele não te merece”. É aquela que, sem dizer nada, segura seu rosto com uma das mãos e, com o indicador da outra, retira da sua face o cílio que se desprendeu dos demais.
A amizade não tem meias palavras, meias verdades, meios gestos, meios quaisquer coisa. Ela acredita em você quando todos duvidam e acusam. Acredita porque confia. Acredita porque é sua melhor amiga de infância mesmo lhe conhecendo há não mais do que meia dúzia de meses. Acredita porque juntos, vive. E como saber onde essa tal amizade se esconde? Ninguém sabe ao certo. Pode estar nos corredores da faculdade, na casa de vizinhos ou até mesmo atrás do balcão de uma farmácia qualquer.
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